quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Liberdade de Fernando Pessoa

LiberdadeAi que prazer 
Não cumprir um dever, 
Ter um livro para ler 
E não fazer! 
Ler é maçada, 
Estudar é nada. 
Sol doira 
Sem literatura 
O rio corre, bem ou mal, 
Sem edição original. 
E a brisa, essa, 
De tão naturalmente matinal, 
Como o tempo não tem pressa... 

Livros são papéis pintados com tinta. 
Estudar é uma coisa em que está indistinta 
A distinção entre nada e coisa nenhuma. 

Quanto é melhor, quanto há bruma, 
Esperar por D.Sebastião, 
Quer venha ou não! 

Grande é a poesia, a bondade e as danças... 
Mas o melhor do mundo são as crianças, 

Flores, música, o luar, e o sol, que peca 
Só quando, em vez de criar, seca. 

Mais que isto 
É Jesus Cristo, 
Que não sabia nada de finanças 
Nem consta que tivesse biblioteca... 

Fernando Pessoa, in "Cancioneiro"
Fernando Antônio Nogueira Pessoa foi um dos mais importantes escritores e poetas do modernismo em Portugal. Nasceu em 13 de junho de 1888 na cidade de Lisboa (Portugal) e morreu, na mesma cidade, em 30 de novembro de 1935.




















































O ortônimo e os heterônimos de Fernando Pessoa
Fernando Pessoa usou em suas obras diversas autorias. Usou seu próprio nome (ortônimo) para assinar várias obras e pseudônimos (heterônimos) para assinar outras. Os heterônimos de Fernando Pessoa tinham personalidade própria e características literárias diferenciadas. São eles:

Álvaro de Campos
Era um engenheiro português de educação inglesa. Influenciado pelo simbolismo e futurismo, apresentava um certo niilismo em suas obras.

Ricardo Reis
Era um médico que escrevia suas obras com simetria e harmonia. O bucolismo estava presente em suas poesias. Era um defensor da monarquia e demonstrava grande interesse pela cultura latina.

Alberto Caeiro
Com uma formação educacional simples (apenas o primário), este heterônimo fazia poesias de forma simples, direta e concreta. Suas obras estão reunidas em Poemas Completos de Alberto Caeiro.

domingo, 15 de abril de 2012

Retratos do Brasil - 3º ano do Ensino Médio

 O pré-Modernismo

 A produção literária brasileira do início do século XX foi marcada pela coexistência de manifestações que davam continuidade à arte do século anterior. Não existia uma orientação estética inovadora e unificadora, mas sim a permanência de traços realistas, naturalistas, parnasianos e simbolistas, que se mesclavam e se aplicavam a novos contextos. Havia, porém, uma importante novidade: os autores pré-modernistas iniciavam
a revisão do nacionalismo, trocando o ufanismo pelo questionamento e pela crítica da organização social do país. Essa crítica atingia setores específicos como o Exército, a administração das cidades e as políticas agrícolas, mas às vezes alcançou maior abrangência e chegou até mesmo a propor um novo projeto de país.

O Pré -Modernismo

Os conflitos políticos que originaram, em 1914, a Primeira Guerra Mundial marcaram o início do século XX na Europa. As grandes transformações científicas e tecnológicas do período resultaram em novos posicionamentos do homem diante do mundo, inclusive no campo artístico. Abordagens inéditas foram experimentadas pelas vanguardas, movimentos estéticos que expressavam o dinamismo dos novos tempos e renovavam a arte europeia. Tal cenário, porém, não contagiou a realidade brasileira nesse período. Nossos artistas preferiram aprofundar o olhar para as questões nacionais, passando ao largo das inovações formais que começavam a ser praticadas na Europa.

A seguir estão reproduzidas uma tela do pintor brasileiro Almeida Júnior (1850-1899) e parte do conto "Cidades mortas", do livro de mesmo título publicado por Monteiro Lobato (1882-1948) em 1919. Os dois artistas retratam o interior de São Paulo.

Caipira picando fumo







Almeida Jr.


Cidades Mortas

Pelas ruas ermas, onde o transeunte é raro, não matracoleja sequer uma carroça; de há muito, em matéria de rodas, se voltou aos rodízios desse rechinante símbolo do viver colonial – o carro de boi. Erguem-se por ali soberbos casarões apalaçados, de dois e três andares, sólidos como fortalezas, tudo pedra, cal e cabiúna; casarões que lembram ossaturas de megatérios donde as carnes, o sangue, a vida, para sempre refugiram.
[...]
São os palácios mortos da cidade morta.
Avultam em número, nas ruas centrais, casas sem janelas, só portas, três e quatro: antigos armazéns hoje fechados, porque o comércio desertou também. Em certa praça vazia, vestígios vagos de “monumento” de
vulto: o antigo teatro – um teatro onde já ressoou a voz da Rosina Stolze, da Candiani...
Não há na cidade exangue nem pedreiros, nem carapinas; fizeram-se estes remendões; aqueles, meros demolidores – tanto vai da última construção. A tarefa se lhes resume em especar muros que deitam ventres, escorar paredes rachadas e remendá-las mal e mal. Um dia metem abaixo as telhas: sempre vale trinta mil réis o milheiro – e fica à inclemência do tempo o encargo de aluir o resto.
Os ricos são dois ou três forretas, coronéis da Briosa, com cem apólices a render no Rio; e os sinecuristas acarrapatados ao orçamento: juiz, coletor, delegado. O resto é a mob: velhos mestiços de miserável descendência, roídos de opilação e álcool; famílias decaídas, a viverem misteriosamente umas, outras à custa do parco auxílio enviado de fora por um filho mais audacioso que migrou. “Boa gente”, que vive de aparas.
Da geração nova, os rapazes debandam cedo, quase meninos ainda; só ficam as moças – sempre fincadas de cotovelos à janela, negaceando um marido que é um mito em terra assim, donde os casadouros fogem. Pescam, às vezes, as mais jeitosas, o seu promotorzinho, o seu delegadozinho de carreira – e o caso vira prodigioso acontecimento histórico, criador de lendas.
Toda a ligação com o mundo se resume no cordão umbilical do correio – magro estafeta bifurcado em pontiagudas éguas pisadas, em eterno ir e vir com duas malas postais à garupa, murchas como figos secos.

Monteiro Lobato, J. R. Cidades mortas. São Paulo: Brasiliense, 1995. p. 22-23.


 Sobre os textos
 1. Como é possível interpretar o estado psicológico do caipira na tela de Almeida Júnior? Relacione esse estado psicológico ao ambiente retratado no quadro.

2. Almeida Júnior empregou cores muito próximas uma da outra para pintar essa tela, dando destaque só a um elemento. Identifique esse elemento e comente o trabalho com as cores observável na pintura.

3. A tela contempla elementos humanos/culturais e elementos naturais. Há uma relação equilibrada entre esses elementos ou um deles predomina? Explique, considerando os elementos do cenário e a figura humana.

4. Releia esta passagem do conto “Cidades mortas”: “Não há na cidade exangue nem pedreiros, nem carapinas.” Explique o adjetivo exangue aplicado ao cenário descrito.

5. Os tipos humanos descritos contribuem para a explicitação do estado atual da cidade. Para você, qual tipo humano simboliza melhor a decadência? Por quê?

6. Almeida Júnior e Monteiro Lobato são artistas com interesses afins. O que aproxima as obras analisadas nesta seção?

Essa atividade deve ser respondida no caderno, mas deixe aqui o seu comentário.

Um grande abraço
Helena Sampaio